Gal

Lá em casa havia uma radiola vermelha e, antes dela, havia Gal.

1985. Eu me lembro: quando meu pai se foi, eu pedi o “Profana” de presente, com a desculpa de que uma música qualquer do disco me faria lembrar-me dele. Mentira! Não havia meu pai, nada disso, havia Gal.

Acho até que, antes da música, já havia Gal. Aquelas flores no cabelo e a boca vermelha, com dentes diamantinos. A naturalidade ao cantar, o umbigo à mostra, a elegância à frente duma beleza cristalina.

A voz de Gal é a da lua no quarto crescente. Antes de lua, acho eu, já havia Gal. Acho, não, tenho certeza. Antes mesmo da Via Láctea.

Antes do rádio, Gal. Antes da história e da biologia, seu nome ecoando na minha cabeça, saindo da minha boca e da minha língua, fácil de dizer como nenhum outro nome. Meus ouvidos só ouviam Gal.

A cada aparição na tv, a cada festa do interior, a cada carnaval, Gal. Antes das outras, ela, divina.

Minha vida, minha voz, minha musa, mãe verdadeira, amiga e cúmplice, plural, fatal, legal, tropical. Desde sempre. Antes de qualquer palavra, Gal.

Antes deste choro que me inunda desde ontem, antes da lágrima e do sorriso, antes da morte, havia Gal. Solta no universo, no palco entre as estrelas, no umbigo de Deus, na explosão primeira, havia nada, só havia Gal.

Publicidade

Um comentário sobre “Gal

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.