Dilma Rousseff, emudecida, tem muita responsabilidade pela “crise” que o Brasil vem enfrentando. Contudo, esta “crise”, a meu ver, é muito menos econômica que política. Apesar da sua enorme responsabilidade como presidenta, cabe a mim apontar o olhar a um outro culpado, desta vez o que eu diria ser um ‘ator coletivo’, constituído por inúmeras cabeças, vozes, mãos e câmeras de televisão, ao redor do ‘mundo euro-americano’, com o qual a mandatária tem que lidar, cotidianamente.
Este ‘ator’, na sua versão brasileira, tem somado, ao longo dos anos, outros sujeitos e corporações ao seu conjunto, sem, contudo, abandonar sua organicidade com as chamadas oligarquias herdeiras de ‘capitais econômicos e políticos’ anteriores aos anos 1900. Engana-se quem pensa que eles vieram a perder poder de dominação, apesar das mudanças nos campos políticos internacionais das últimas décadas.
Um exemplo ocorreu, que pode demonstrar a forma preferencial de exercício de poder em terras brasileiras. Trata-se das imagens em vídeo da entrada dos policiais na casa do tesoureiro do PT, antes do amanhecer desta madrugada de 06 de fevereiro de 2015, provam que o que está em curso – “na mídia”, especialmente a mais “poderosa” – é um trabalho de “criminalização” – ou de criação de uma “narrativa” (Lula, 2015) – junto à opinião pública sobre o seu PT, que vem ocupando a presidência da república há 4 mandatos de quatro anos, além dos espaços regionais que conquistou desde os anos 1980, sempre em coligação com partidos congêneres, com maior ou menor sucesso, em executivos e legislativos nas capitais de estados e pelo interior do Brasil.
O PT está entre os maiores partidos do país, embora tenha nascido junto com todos os atuais maiores partidos, no início dos anos de 1980. Sua vertente sindical o inclui tardiamente na tradição ‘trabalhista’, sem nunca renegar a raiz cubana dos demais movimentos de combate à ditadura. Desde a sua criação, procurou distanciar-se dos valores e princípios ‘de direita’, com flerte inicial com um projeto ‘socialista’ que, entretanto, a partir dos anos de 1990, veio a ressaltar sua vertente ‘social-democrata’ liberal. Vale comparar o ‘quanto’ conseguiram, nestas duas décadas e meia, o PT e o PMDB, enquanto o PDS/PFL/DEM diluia-se em fisiologismos.
Agora, vejamos até onde chegou o PSDB, que nasceu quase uma década depois dos primeiros daqueles partidos, como uma corporação de interesses privados muito específicos e nem sempre dignificantes, em torno de um neoliberalismo financista, com concessões a ‘certos’ direitos sociais previstos na Constituição Federal. Observando as trajetórias dos nossos diferentes partidos, com as suas contradições e conquistas – e com suas vinculações com as instituições vigentes desde períodos históricos anteriores – podemos compreender seus projetos de poder, a maior parte deles já bastante anacrônicos, se relacionados às demandas populares em vigor neste século 21.
Assistimos ao melancólico culminar da ‘luta’ entre os setores que conviviam no Estado ‘pós-colonial’ brasileiro, em especial desde o ocaso da ditadura economicamente liberal, em vigor institucional até a penúltima década do século 20. Antes dela e depois, o Brasil sempre incumbido de, dentre outros explorados, viabilizar a construção dos estados-nação europeus.
Para o PT, resta recuperar a ação primordial de se destacar dos partidos conservadores, na prática e no discurso. Quanto maior o seu envolvimento com ‘setores’ que compõem, em diferentes níveis, aquela coletividade “hegemônica”, personificada exemplarmente pelos grandes veículos emissores de conteúdos de ‘midiáticas’ – veículos estes financiados pelo poder público – quanto mais atado àqueles setores, maior será a seu esfacelamento como instituição política.
O referido lobby mediático assume o papel de ‘tradutor’ da ‘ideologia’ daquele ‘ator’, que é internacional (com o Brasil junto) e também masculino, econômica e socialmente conservador e ‘burguês’. ‘Personalizam-se’ nos tais estados-nação, que saíram de moda ali pelo final do século 19, que todavia, fizeram guerra iminente, fez-se dinheiro com a miséria alheia . Dentre iúmeras outras coisas, sugiro recuperar o slogan, O Petróleo É Nosso, e dar-lhe novo ‘sentido’. Mesmo que seja fazer nada com ele. “Living / in a material world…”
É preciso conhecer o Tratado de Maastricht, de 1988, bem como seus ascendentes jurídicos e seus desdobramentos nesta ‘entidade’ corporativa financeira, mãos transacionais daquele ‘ator’, face entre-cultural e ficção sociológica, chamada de “mercado”.
Quem são, finalmente, os homens e mulheres que ‘comandam’ esse ‘ator’?
O que é um “país”? “Tá tudo dominado”?
A propósito, já fez um ato de subversão não violenta hoje? Você está em grupo?
A quais interesses cada um de nós atua? Quais os ‘interesses’ que estão com a Dilma Rousseff? E com o Joaquim Barbosa, Aécio Neves, Marina Silva, José Serra e Eduardo Cunha?
Refletir. E também comer banana e kiwi. Conquanto eu não seja (apenas) um macaco, um golfinho, ou um ‘charlie’, um ‘índio’. Para muito além disto, estamos em comunidades. E a Dilma, está com quem? E o Lula? O Fernando Henrique Cardoso?
Eu só sei de mim, em princípio. E de você, agora.
Silêncios. Vou comer frutas antes de almoçar.
Vemo-nos a seguir.
Até lá.
